#148 – Como você se desloca na sua cidade?
jul 15, 2022

Compartilhar

Assine o Oxigênio

O deslocamento das pessoas pelos centros urbanos é sempre uma preocupação, não só para os cidadãos, mas para o poder público, que deve fornecer o melhor tipo de transporte para a população, sejam os ônibus, trens, metrô. Neste último episódio da série Cidades, o Oxigênio mostra algumas das opções de transporte coletivo, e como é o sistema em Campinas. Os entrevistados foram o Fernando Ribeiro, que é mestre em Sistemas de Infraestrutura Urbana pela Puc Campinas e a Renata Pereira, mestra em sustentabilidade e estudou justamente a mobilidade urbana sustentável em Campinas. Quem produziu esse podcast foram a Bianca Bosso, o Luís Botaro e a Mariana Meira, estudantes do curso de Especialização em Jornalismo Científico do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo, da Unicamp.

__________________________________________________

Roteiro

Bianca Bosso: Quanto tempo você gasta no trânsito diariamente?
Essa resposta pode variar bastante dependendo da sua cidade, do tipo de transporte que você usa e da distância entre sua casa e os locais onde você trabalha, estuda e se diverte.
E pra entender quais são os fatores que influenciam essa resposta, nós entrevistamos especialistas e pesquisadores que vão falar um pouco sobre mobilidade urbana, mais especificamente na cidade de Campinas, no interior de São Paulo.
Eu sou a Bianca, e esse é um episódio especial da série “Cidades” pro podcast Oxigênio. É com você, Luis!

Luís Botaro: Pra começar nossa discussão sobre mobilidade urbana em Campinas a gente decidiu trazer alguns dados disponibilizados pela plataforma Moovit.

Esse serviço atua na cidade oferecendo informações que ajudam os usuários do transporte público a descobrir os horários e as rotas dos ônibus e também o tempo de espera.

Em média, as pessoas levam 49 minutos para completar uma viagem de ônibus. E nessa conta, a gente ainda pode adicionar o tempo de espera pelo ônibus, que é de cerca de 26 minutos.

Somando isso tudo, desde o momento em que a pessoa sai de um ponto até o momento em que ela chega no destino, ela leva em média 1 hora e 15 minutos. E se a gente considerar que ainda tem a volta, são pelo menos 2 horas e meia de transporte por dia. Bastante tempo, né, Mariana?

Mariana Meira: Pois é, Luís! Mas olha, esses números são um pouco diferentes dos dados apresentados pela EMDEC, Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas. Ela é quem atua em parceria com a Secretaria Municipal de Transportes e quem tem a concessão dos ônibus coletivos municipais. E segundo um relatório que ela publicou em 2019, esse tempo de viagem seria 9 minutos mais curto: ou seja, levaria 40 minutos no total.
Só que esses dados do relatório são baseados em uma pesquisa de 2011 – 11 anos atrás – e por isso não refletem com exatidão a situação atual em uma metrópole que já mudou muito.

Bianca: A boa notícia é que esse tempo pode mudar bastante com a implantação do BRT, uma sigla que quer dizer Ônibus de Trânsito Rápido. Esse projeto está sendo implantado em Campinas desde 2016, e a expectativa pra conclusão da obra não para de crescer na cidade, já que a previsão inicial era o final de 2020.
Só que antes de falar sobre prazos, me fala, você sabe exatamente o que é o BRT?

Luís: Para entender do que se trata esse projeto, a gente chamou o Fernando Ribeiro, que é mestre em Sistemas de Infraestrutura Urbana pela Puc Campinas. Na primeira resposta, ele explicou o que é o BRT e como ele vai funcionar na cidade. Vamos ouvir o que ele disse:

Fernando Ribeiro: O BRT, atualmente em obras, será constituído de dois corredores principais, Ouro Verde e Campo Grande, que farão a ligação dos respectivos distritos ao Terminal Central, e também será constituído do Corredor Perimetral, que ligará os dois corredores principais.

O BRT, ele está localizado nesta região específica de Campinas para atender dois dos maiores fluxos de transporte coletivo da cidade, que conectam os distritos ao centro e vice-versa. Então, ele tem o potencial de suprir as necessidades dessas regiões, mas não de Campinas como um todo, porque ele está localizado numa região específica da cidade.

Porém, é esperado que, uma vez que haja um aumento da eficiência na região desses corredores, as linhas convencionais que alimentam e são alimentadas por esses fluxos também serão beneficiadas pelo aumento da eficiência. Então, vai existir um raio de influência desses corredores, por mais que não vai influenciar a cidade como um todo.

Mariana: O Fernando explicou também por que é tão importante criar um sistema de ônibus que conecta os bairros mais distantes à região central de Campinas:

Fernando: A configuração espacial da cidade de Campinas é caracterizada pela concentração da oferta de serviços e empregos, exigindo mais deslocamentos das áreas periféricas para as centrais.

Bianca: Gente, é bem interessante perceber que os corredores do BRT foram projetados pensando especificamente na organização urbana de Campinas, né?

Luís: Sim, Bianca, esse projeto de BRT foi pensado para atender principalmente quem precisa fazer longos deslocamentos devido a essa concentração de serviços e postos de trabalho nas regiões centrais.

Mariana: E pra entrar mais a fundo nesse tema, nós também conversamos com a Renata Pereira, que é mestra em sustentabilidade e estudou justamente a mobilidade urbana sustentável em Campinas.
A gente começou perguntando para a Renata sobre as distâncias físicas que envolvem o acesso a serviços de saúde e educação e também ao trabalho e ao lazer, especialmente numa cidade como Campinas, que teve uma expansão urbana muito acelerada para regiões afastadas do centro.

Renata Pereira: Os desafios da expansão das cidades brasileiras é intenso, principalmente no quesito da acessibilidade da população periférica – que geralmente é a mais afetada pelo crescimento desordenado das cidades (já que tem a renda mais baixa, claro).

Os longos deslocamentos afetam não só economicamente, mas também socialmente, limitando o acesso a lazer, saúde e oportunidades em geral, diminuindo a qualidade de vida do cidadão.

Bianca: Essa questão do tempo de deslocamento e como ele interfere na qualidade de vida não é um problema recente, viu?

Antes do BRT, Campinas já passou por outros projetos dedicados ao transporte público, como o VLT, que são os Veículos Leves Sobre Trilhos e o VLP, que são os Veículos Leves Sobre Pneus.

E como todos esses sistemas acabaram sendo desativados depois de um tempo, a gente perguntou pra Renata quais seriam as vantagens do BRT em relação a esses modelos e porque ele foi escolhido.

Renata: O diferencial do BRT a outros tipos de soluções, como o VLT e o metrô, são principalmente focados em relação ao custo de implantação e manutenção e o tempo gasto pra implantação dos sistemas. Lembrando aqui que o BRT ainda não está cem por cento completo em Campinas, entrando no quinto ano da construção. Pra que no quesito velocidade de implantação fosse mais viável o BRT do que um VLT, por exemplo, ele deveria ser completado em torno de dois anos e meio – restou então a questão aí do custo de implantação pra que ele fosse escolhido em relação ao VLT, por exemplo.

Luís: Bom, agora que a gente já entendeu melhor como o BRT funciona e porque ele foi escolhido, a Renata vai explicar pra gente um outro lado do projeto.

Será que o BRT pode deixar de atender alguma necessidade de Campinas?

Renata: A maior necessidade não contemplada é a facilidade de acesso ao usuário em torno dos corredores. Isso pode trazer um desafio a mais pro comércio e pros serviços do local, pois isola os passageiros dentro do sistema. O que pode ser facilmente resolvido também com um sistema de saída, por exemplo, das plataformas, sem custo, com uma restrição de vinte minutos, por exemplo, pra entrar e sair na mesma plataforma.

Mariana: O interessante disso que ela falou é que, de fato, o BRT afeta não só a vida dos usuários, mas todo o entorno de comércio e pessoas que circulam perto da estrutura dele.

Bianca: É isso mesmo. E, aproveitando esse gancho, além de entender como o projeto afeta a cidade, também é importante a gente saber como ele vai se comportar ao longo dos anos, porque o crescimento urbano não deve parar, né?

Luís: Então, para finalizar a conversa com a Renata, a gente perguntou se dá para prever o ritmo de crescimento urbano em Campinas e como o BRT vai dar conta de garantir um serviço de transporte eficaz e sustentável depois que ele for implementado.

Renata: É possível estatisticamente prever o ritmo de crescimento, sim. Lembrando que modelos estatísticos não levam em conta, né, mudanças estruturais drásticas, por exemplo a pandemia como foi.

Pra avaliar se o BRT sustentará a demanda e por quanto tempo isso vai acontecer, seriam necessários mais estudos, com certeza. Mas, na minha opinião, é sempre importante investir em novos modais de transporte, especialmente os coletivos e os não motorizados, como as bicicletas e a caminhada, além de investir no planejamento urbano ordenado, preferencialmente de zoneamento misto, que permite que a população não precise se deslocar pra tão longe das suas casas todos os dias.

Mariana: A Renata enfatizou dois pontos importantes: primeiro, que os estudos ainda não são suficientes pra saber por quanto tempo o BRT vai ser “útil” para a cidade, e, segundo, que é preciso investir em outros modais de transporte.

A gente também quis entender qual é a visão do Fernando sobre isso, e na opinião dele, as soluções teriam que envolver uma mudança estrutural mais complexa da cidade. Vamos ouvir o que ele disse:

Fernando: Enquanto os destinos forem concentrados, e distantes dos pontos de origem, o sistema de transporte ficará sobrecarregado. Enquanto houver muita gente indo pra um mesmo lugar, o sistema vai ficar sobrecarregado. Você pode tentar amenizar isso com uma oferta maior de transporte público, mais frotas, mais horários de circulação, restrição ao transporte privado pra liberar espaço pro transporte público, ou você tirar o transporte da superfície e colocar o subterrâneo, os metrôs, o que é uma opção muito cara.

Porém, somente uma reconfiguração do tecido urbano, favorecendo a centralidade de bairros, encurtará as distâncias entre os pontos de origem e destino, tornando o uso do transporte público coletivo e até mesmo de modos não-motorizados mais atraentes e possíveis.

Bianca: Bom, as falas da Renata e do Fernando foram bem legais pra gente entender as promessas do BRT pra população que vive e se locomove em Campinas. Mas é importante a gente destacar que o projeto ainda não está concluído, apesar de quase 2 anos já terem passado após a data prevista pra conclusão.

Nós conversamos com o Secretário de Infraestrutura de Campinas, o Carlos José Barrero, pra ele explicar alguns dos motivos que levaram a esse atraso.

Luís: Segundo Barrero, a pandemia da Covid-19 foi a principal causa para o atraso nas obras do BRT.
Em entrevista à rádio CBN, ele explicou ainda que muitos contratos e licitações ficaram parados nesse período, atrasando questões burocráticas relativas à obra.

Mariana: Ao nosso podcast, ele afirmou que a previsão é de que em 2023 essas obras estejam 100% finalizadas e já funcionando para a população.

Bianca: Bom, depois de ouvir os especialistas e o gestor público, deu pra entender que uma obra como o BRT envolve transformações importantes na infraestrutura da cidade, além de mexer na rotina tanto dos moradores quanto do comércio e das empresas.

Por isso, falar do BRT Campinas não é falar só de mobilidade urbana de uma grande metrópole, mas também de desenvolvimento econômico e de inclusão, porque mais pessoas vão poder circular e, assim, fazer o capital na cidade girar.

Luís: Bom, esse foi o episódio especial da série cidades do podcast Oxigênio. Essa é uma produção da Oficina de Multimeios ministrada pela professora Simone Pallone no Labjor da Unicamp.

Mariana: Esse podcast foi produzido e apresentado por Bianca Bosso, Luís Botaro, e por mim, Mariana Meira.

Veja também

#180 – Soluções Baseadas na Natureza

#180 – Soluções Baseadas na Natureza

É possível encontrar soluções para os problemas que enfrentamos com o acirramento da crise ambiental e climática? As Soluções Baseadas na Natureza se apresentam como alternativas tanto para mitigar a crise e melhorar a nossa vida nas cidades, quanto para aumentar a produtividade de cultivos ao mesmo tempo em que promove uma agricultura sustentável.

#179 – Comida Frankenstein e a ética na ciência

#179 – Comida Frankenstein e a ética na ciência

Comida Frankenstein? Sim, esse termo, que remete a um dos monstros mais conhecidos da ficção científica, tem sido usado para tratar de comidas que usam organismos geneticamente modificados. Neste episódio tratamos sobre a ética científica e outras questões que envolvem esses produtos.

#174 – Um esqueleto incomoda muita gente

#174 – Um esqueleto incomoda muita gente

Novas descobertas sobre evolução humana sempre ganham as notícias e circulam rapidamente. Mas o processo de aceitação de novas evidências entre os cientistas pode demorar muito. Neste episódio, Pedro Belo e Mayra Trinca falam sobre paleoantropologia, área que pesquisa a evolução humana, e mostram porque ela é cheia de controvérsias e disputas.

# 171 – Adolescência – ep. 2

# 171 – Adolescência – ep. 2

Alerta de gatilho: Este episódio da série “Adolescência” trata de temas difíceis, como depressão, ansiedade, impulsividade e sentimentos ligados às relações familiares, entre eles conflitos entre pais e filhos e também como lidar com essas questões. Ao falar destes...

#169 – Depois que o fogo apaga – Parte 2

#169 – Depois que o fogo apaga – Parte 2

Seguimos falando sobre o processo de recuperação de museus e acervos que pegaram fogo no Brasil. Quais são as etapas até a reabertura? Quem participa desse processo? Ouça como está sendo o trabalho no laboratório da Unesp em Rio Claro, o Museu Nacional do Rio de Janeiro e o Museu da Língua Portuguesa em São Paulo.