#202 – Sônia Bridi: histórias de vida, de jornalismo e de ciência
out 9, 2025

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Ao planejar a série comemorativa dos 10 anos, a equipe do Oxigênio pensou em vários podcasts que poderíamos convidar e logo veio a ideia de convidar o Vida de Jornalista, um podcast independente, conduzido pelo jornalista Rodrigo Alves. Além de produzir o podcast que é uma referência para quem faz e quem estuda jornalismo, Rodrigo oferece oficinas de podcast e algumas pessoas do grupo já tinham sido suas alunas. Convite aceito, logo nos reunimos online e acertamos quem seria nossa entrevistada: Sônia Bridi, de quem faríamos o perfil, buscando mesclar com elementos do jornalismo narrativo, no estilo do Oxigênio. Nosso parceiro entrou de cabeça no projeto. Com contatos na Globo, onde trabalhou por alguns anos, e amigos em comum, Rodrigo conseguiu fazer o convite e a Sônia aceitou. Entrevista agendada, estúdio reservado, e aí tivemos uma breve disputa para ver quem seria a/o privilegiado de entrevistar a grande jornalista, junto com o Vida de Jornalista, no Estúdio Rastro, no Rio… e a coordenadora do podcast, que dificilmente produz um episódio, ganhou a disputa.

Bem, neste episódio saímos bastante do padrão do Oxigênio, estando mais próximo dos episódios produzidos pelo Vida de Jornalista, nosso parceiro neste episódio da série Parcerias. Com uma hora de duração e apenas uma entrevistada, o episódio traz várias histórias da jornalista Sônia Bridi, um ícone do jornalismo brasileiro, bastante conhecida por seu trabalho na TV, mas que nossos ouvintes vão ouvir que antes de chegar ao Fantástico, Sônia realizou outros trabalhos. Apresentamos nesse perfil, histórias de jornalismo, de jornalismo científico, socioambiental, e algumas passagens da vida pessoal da nossa entrevistada.

Agradecemos muito a disponibilidade de Sônia pra dar a entrevista e em especial ao Rodrigo Alves que fez um trabalho incrível de edição do material (enorme) e por ter aceito tocar essa parceria com o Oxigênio.

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Roteiro

[Vinheta Oxigênio: Voz feminina: Você está ouvindo Oxigênio].

[MÚSICA – Todas as músicas do episódio são tocadas no violão].

SÔNIA BRIDI: Eu sempre falo isso. Que eu era uma criança deslumbradona assim, sabe, de deitar na grama e ficar olhando para as nuvens, e tentar entender por que é que umas estavam indo para um lado e outras estavam indo para o outro. Adorava ficar observando. Adorava ficar olhando o céu de noite. Naquelas noites frias de inverno. Então, pouca poluição luminosa. Ficava aquele céuzão assim que parecia que ia cair em cima da gente. E eu gostava de andar no mato. Eu gostava de olhar as flores, as plantas. Eu tinha uma horta em casa que eu cuidava. E eu me lembro que eu amava pegar a enciclopédia e ficar: como são formados os vulcões? O Popocatepetl surgiu de um dia para outro numa plantação de milho no México. E aquilo, para mim, era um troço assim incrível. Eu tinha curiosidade. E a ciência é fascinante, né? A ciência, quanto mais a gente sabe, mais a gente se dá conta que não sabe. E mais fascinante vai ficando e mais curiosa a gente fica. 

[MÚSICA]

RODRIGO ALVES: Essa voz que você ouviu na abertura… você provavelmente já sabe quem é. Não só porque você já deve ter visto o título do episódio, mas porque você já deve ter escutado muito essa voz na televisão. A gente tá falando de uma lenda do jornalismo brasileiro. A Sônia Bridi. E sim, esse é um perfil que vai passar por toda a trajetória dela.

SIMONE: E esta voz que você acaba de ouvir é bem provável que você também conheça. É o Rodrigo Alves, do podcast Vida de Jornalista. Oi, Rodrigo, você pode se apresentar e apresentar o Vida pra quem ainda não conhece.

RODRIGO: Oi oi. Obrigado demais por essa parceria, tô muito feliz de dividir esse episódio com o Oxigênio. Parabéns pelos 10 anos. O Vida de Jornalista tem 7 anos e eu já acho que é muita coisa, imagina o Oxigênio que tá na estrada há tanto tempo. O Vida é um podcast narrativo com histórias e bastidores do jornalismo. Então esse episódio é uma honra pra mim, tanto pela nossa parceria, como pela entrevistada.

SIMONE: E eu sou a Simone Pallone, coordenadora do Oxigênio. Este é o episódio número 202 e o terceiro da nossa série comemorativa dos 10 anos, que estamos fazendo com podcasts que admiramos. Fizemos o convite ao Rodrigo e ele não só aceitou, como entrou de cabeça na produção do episódio. E pra celebrar esse encontro, entrevistamos a incrível Sônia Bridi.
O episódio está bem diferente dos outros. Está mais longo e temos uma única entrevistada. Aproveitamos a parceria com o Vida, que tem produzido uma série de perfis, pra inovar.
Esse material está também no feed do Vida de Jornalista, com uma abertura um pouco diferente, mas o conteúdo da entrevista é o mesmo. E pra você que ainda não segue o Vida, aproveita pra começar a seguir. Você não vai se arrepender.
E vamos à entrevista que, como diz o Rodrigo, a gente começa do começo. No caso da Sônia, a quem agradecemos muito que tenha aceitado o nosso convite, o começo é em Santa Catarina. 

SÔNIA BRIDI: As minhas memórias de infância são sempre relacionadas ao frio, a pinhão na chapa, torrando. A casa, a primeira casa que me lembro de onde morei era uma casa que não tinha energia elétrica e ficava dentro do pátio de uma serraria. Meu pai tinha uma serraria, meu pai era madeireiro. Então, você vai vendo que a minha conta carbono é cumulativa.

RODRIGO: Se você tá achando curioso o fato de que a Sônia Bridi, tão ligada à ciência e ao meio ambiente, tinha um pai madeireiro, calma que daqui a pouquinho ela vai voltar nessa história. Mas antes a gente precisa entender como o jornalismo apareceu na vida dela.

SÔNIA BRIDI: E aí, quando eu estava com 5 anos, a minha família decide se mudar para Caçador, para a sede da cidade, porque meus irmãos mais velhos já estavam indo para a escola, e a escola ali era muito precária. E meus pais tinham 4 anos de estudo cada um, e eles fizeram da vida deles o objetivo que os filhos tivessem acesso à escola, estudo, enfim. E a minha mãe, o sonho dela era ter sido professora, por ela as 6 filhas seriam todas professoras. Tem uma, pelo menos, que é professora universitária. E ela fazia uns cartões, assim, para ensinar os meus irmãos mais velhos a ler. E nesse ponto em que ela estava ensinando meus irmãos, quem está ali na obrigação não presta muita atenção, quem não está na obrigação está mais de olho, né? E ela botava uma palavra e eu dizia bote, pato, não sei o quê, e ela dizia, você está adivinhando? E aí começou… eu estava lendo, porque eu estava prestando mais atenção do que… Então, quando eu entrei na escola com 6 anos, eu já estava alfabetizada, eu lia livrinho. Eu odiei a escola no primeiro ano, porque eu sabia tudo e eu era faladeirinha e tal. Então, a professora perguntava coisas, eu levantava o braço e ela ficava meio irritada comigo. E às vezes eu dizia que estava doente e ficava em casa lendo sozinha, porque era um silêncio na casa. Meus irmãos, todos na escola, nós somos oito. Ficava aquele silêncio e eu lá com o meu livrinho. Então, era assim, era o meu momento. E como é que o jornalismo entra nessa história? No quarto ano, estávamos lá com uma professora maravilhosa. A professora Tânia. A Tânia era uma moça bonita, bonita, uma italiana de cabelo preto e os olhos azuis. Linda, linda! É claro que todos os alunos, nós éramos todos fascinados por ela, porque, além de ser linda, ela era uma professora maravilhosa. E ela levou a gente para conhecer uma fábrica de papel que tem na cidade. E ela disse: vocês perguntam tudo o que quiserem saber e, quando voltarem, vão fazer uma redação. Aí eu peguei um gravador, imagina, era uma caixona desse tamanho, emprestado de um amigo, e eu fiquei fazendo perguntas para todo mundo. Eu entrevistei todo mundo. Não sei de onde tirei aquela ideia. E aí fiz uma redação, que foi a minha primeira reportagem, eu acho. E aí a professora, quando entregou para mim, disse: Sônia, você devia ser jornalista.

[MÚSICA]

SÔNIA BRIDI: Eu trabalhei na creche local, acho que eu tinha uns 12, 13, ajudei a fazer um levantamento no bairro inteiro de quantas crianças em idade pré-escolar tinham, porque estava abrindo uma creche e tal, e depois eu fui assistente lá na creche. Aí aquele contratinho de um ano acabou, a paróquia estava sem ninguém para fazer secretaria, e eu fui trabalhar de secretária na paróquia. Mas, por mais que eu gostasse do padre Silas, que era o nosso padre lá da paróquia e tudo, era um trabalho bem chato. E aí eu pensei, eu queria ser jornalista, né, estou pensando nisso para o meu futuro, aí eu já estava com 14 anos.

RODRIGO: Aquela professora tinha falado aquilo e ficou… 

SÔNIA: Ficou ali, e eu continuava, eu fazia as redações, tinha concurso de redação. E aí tinha um jornal local que saía duas vezes por semana. Um belo dia, eu disse: quer saber de uma coisa? Eu vou pedir emprego lá. Aí cheguei e falei com o Nilson Thomé, um grande historiador, um intelectual daqueles que aparecem muito de vez em quando no mundo. É claro que eu bati lá. O Nilson: quando você crescer, você volta. E aí eu achei, levei literalmente, achei que fiz aniversário, volto lá. E num desses dias que eu voltei lá, o meu professor de português estava lá. E aí eu saí e ele falou: mas o que a minha aluna estava fazendo aqui? Ela está querendo emprego. Ele disse: dá um trabalho para ela, ela é boa aluna. E aí ele me disse assim, olha, se você quiser, você pode fazer uma coluna, mas você vai ter que vender o patrocínio da coluna. Eu nunca ganhei um tostão em dinheiro, mas eu fazia permuta com as lojas de discos e de livros. E aí eu vivi a minha vida assim até mudar para Florianópolis, onde eu consegui um trabalho de redatora numa rádio FM, que era bem inovadora, porque era uma rádio de notícias em FM.

RODRIGO: E você foi para Floripa para fazer a faculdade de filosofia, né?

SÔNIA: Fui fazer filosofia.

RODRIGO: Por que filosofia?

SÔNIA: Ah sei lá, eu era uma garota meio estranha, eu acho, né? E a faculdade de filosofia não resistiu à minha entrada em uma redação. A minha paixão ficou muito bem demarcada ali, né? Eu quis continuar naquela reta. E aí eu fui fazer outro vestibular para ir para o jornalismo. E aí, durante as enchentes de 83 e 84, a gente teve grandes enchentes em Santa Catarina. 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Apresentador: As chuvas do início de julho provocaram uma das piores catástrofes naturais da história de Santa Catarina: 135 cidades do estado foram atingidas…

RODRIGO: Essa é uma reportagem da TV Barriga Verde em 2013, lembrando as enchentes de 83.

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Apresentador: E os números eram desoladores. 198 mil pessoas desabrigadas, pelo menos 49 mortos e 32 dias de isolamento total em algumas localidades. As cidades mais atingidas foram Rio do Sul, Blumenau e Itajaí.

SÔNIA: Em 83 eu estava na TV Barriga Verde como produtora e editora. A Barriga Verde não tinha rede nacional, era uma TV independente. Aí eu fui para a TV Cultura, que era com a Bandeirantes. E eu estava grávida da Mariana. Então eu fui para a Central da Defesa Civil e eu ficava lá fazendo os boletins e mandando notícia para alimentar a rádio e a TV. E ali eu conheci uma repórter da RBS, que é uma das minhas melhores amigas até hoje, que era a Maria Celeste Corrêa. E a gente conversou, enfim, a gente ficou amiga ali, naqueles plantões que não se acabavam. E aí eu estava com a minha filha recém-nascida. A Maria Celeste bateu lá em casa e disse: Sônia, tenho uma vaga de editor na RBS para editar o RBS Notícias. Eu indiquei seu nome. Você quer? Eu falei, quanto é? Era o dobro do que eu ganhava. No meio da licença maternidade, eu aceitei o emprego e fui trabalhar de editora na RBS. 

SIMONE: Ainda na faculdade, a Sônia passou a ser repórter na RBS, que é a afiliada da Globo. Em 1989, surgiu uma pauta importante pro Jornal Hoje. Que acabou virando a estreia dela no Jornal Nacional.

SÔNIA: Era uma história, uma denúncia de trabalho infantil na Serra de Santa Catarina. Na Mata Atlântica. Tinha tudo o que eu gosto de cobrir. Tudo o que eu gosto de prestar atenção. Tinha destruição ambiental. Tinha direitos humanos. Proteção à criança. Tudo no mesmo lugar. Eu fiz aquela matéria. Fiz para o Hoje. A gente mandava a matéria já editada. E quem estava no plantão, os editores que estavam no plantão, viram a matéria e disseram: vamos deixar essa para o JN. Me ligaram no meio da tarde e disseram, está preparada? Você vai estrear no JN hoje. Era muito restrito o número de repórteres que entravam no Jornal Nacional. Era super difícil você se tornar um repórter de rede. 

SIMONE: E, Sônia, como foi a reação da sua família ao te ver no Jornal Nacional? Seus amigos, professores…

SÔNIA: Meus pais, eu acho que eles tomaram um susto muito grande conforme eu fui trabalhando na televisão. Aquilo para eles era muita visibilidade, você imagina. A minha mãe queria que eu fosse professora primária. Então, de repente, estou eu fazendo televisão e fazendo notícia, e no Jornal Nacional e tal. Com o tempo, meu pai foi ficando assim mais vocal, de mostrar que tinha orgulho e tal. Às vezes eu estava lá, vinham os amigos para me conhecer e tal, esse tipo de coisa. A Mariana, quando era pequenininha, ela às vezes ficava na creche, na escola, às vezes na casa da avó, a avó paterna. E eu ia pra onde? Eu ia pra televisão. E aí, um dia, ela aprontou alguma, a avó deu uma bronca e ela chorando, foi pra frente da televisão e disse: Xuxa, chama minha mãe aí.

[MÚSICA]

RODRIGO: A Xuxa ainda tava longe, mas foi por pouco tempo. Em 1991, a Sônia foi pro Rio de Janeiro, pra ajudar na cobertura da Globo no Carnaval. E em julho, ficou de vez no Rio.

SIMONE: São mais de 30 anos de Globo, e agora a Sônia vai contar pra gente os bastidores de algumas coberturas marcantes da carreira dela. Começando por uma das primeiras, ali em 1993: a chacina da Candelária, que ainda tá gravada na memória. Dela e de muitos de nós.

SÔNIA: Eu enxergo todas as imagens à minha frente até hoje. Cada detalhe das imagens. Tinha um… Esse grupinho ficava ali na região da Candelária. E poucos dias antes eu estava num plantão em que eu fiquei ali parada na frente do antigo Ministério da Fazenda esperando o fim de uma reunião, e esse grupinho estava ali. E eles estavam cheirando cola. E eu fiquei falando para eles, tentando explicar que fazia mal para o cérebro, não sei o que. E tinha um muito pequenininho entre eles. Fiquei aquela coisa, você fica parada ali, um monte de jornalista, estão as crianças ali, você conversa, não sei o que, dá um picolé para cada um, aquelas… E eles estavam morando na rua. E quando eu cheguei lá eu reconheci as crianças com quem eu tinha conversado. E uma das cenas mais horrorosas é que o mais pequenininho, sabe esse cobertorzinho cinzento assim? Ele estava com o cobertor em cima da cabeça. E o pezinho dele estava de fora. Ele era tão pequenininho que ele se escondeu a cabeça e não escondeu o pé. Sabe que ele não sabia nem se esconder. Você vivia num lugar onde isso aí era banalizado e aceito, é uma coisa horrorosa. Eu estava lá no local, cheguei e estava escuro ainda. E de repente encheu de gente, de repórteres, tudo. E eu me lembro que a minha entrada, eu entrei muito indignada. 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

SÔNIA: Um menino estava dormindo em cima da banca de jornais quando foi acordado pelos tiros. Apavorado, ele viu os amigos sendo mortos sem poder fazer nada.

SÔNIA: Eu estava muito, muito revoltada. Você chega ali, aquelas crianças tinham a idade da minha filha. Menos. Eu me lembro o choque que foi sair de Floripa, que ainda era uma cidade bem menorzinha, de entrar nas favelas e pensar por que não tem um programa massivo de habitação nesse país? E ali eu cobri muito a questão da violência, né?

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sérgio Chapelin: Uma nova chacina abala o Rio. Trinta e nove dias depois do assassinato dos meninos da Candelária, policiais militares são acusados de outro massacre. Mais de 30 homens mascarados usando bombas e metralhadoras invadiram a favela de Vigário Geral, um subúrbio do Rio.

Sônia Bridi: A primeira parada dos matadores aqui na favela foi neste bar, onde estavam, além do dono, mais oito fregueses que jogavam cartas e bebiam aqui. Os homens chegaram, se identificaram como policiais e pediram os documentos. Quando os fregueses começaram a mostrar os documentos, um dos matadores jogou uma bomba que abriu esse buraco aqui no chão. Sem ter para onde fugir, porque as janelas têm grades, começou o horror. Dá para ter uma ideia do número de disparos pelos buracos deixados na parede e nessa cadeira de metal.

[MÚSICA]

RODRIGO: E aí você… bom, você teve essas coberturas assim que você chegou ao Rio, logo depois, 93… e em 95 você começa a trabalhar como correspondente, né?

SÔNIA: Uhum.

RODRIGO: Só que a sua primeira escala como correspondente foi uma escala mesmo, né?

SÔNIA: Foi uma escala, eu fui pra Londres.

RODRIGO: Durou pouquíssimos meses, como é que foi?

SÔNIA: Eu fui pra Londres. Pra ser correspondente em Londres. O Silio Boccanera tinha saído, imagina, eu vou pra vaga do Silio Boccanera, para com isso. Quando eu liguei para casa e falei para os meus pais, vamos só deixar claro, eu já não era nem uma criança, eu tinha 30 anos de idade. Eu falei para os meus pais: olha, eu vou morar em Londres, eu vou ser correspondente, então eu estou indo daqui a 30 dias. Enfim, a minha mãe não gostava muito de viajar, mas o meu pai era super pé na estrada. Aí meu pai falou: eu vou aí para me despedir. Aí ele veio. Meu pai, madeireiro, ele teve serraria lá no interior de Santa Catarina, depois, quando a gente estava em Caçador, aquele período ali, ele fazia de tudo, ele comprava e vendia coisas e tudo para sustentar oito filhos. E aí, quando eu estava no primeiro ano da faculdade, o meu pai resolveu comprar uma serraria no Paraguai, perto da fronteira com o Brasil. Acabou que eu me formei, vim para o Rio de Janeiro, vim trabalhar no Rio e aí, de repente, eu fui convidada para ser correspondente em Londres. Eu estava naquela coisa de preparar a minha ida, não estava trabalhando, e eu levei o meu pai para ir ver as grandes árvores da Floresta da Tijuca. A gente está ali, chega um grupo de turistas, me reconhece, pede para tirar uma foto e eu vejo o meu pai na árvore, assim, olhando para cima e eu pensei: o pai está rezando. Que estranho. Aí eu cheguei e falei, aí pai, está rezando? Ele disse: estou calculando quantos metros cúbicos de madeira tem essa árvore. Então, a lógica era essa. Mas as coisas que a geração dele fez, eles não tinham muita ideia do que estava acontecendo e das consequências. Agora a gente tem. Então eu acho que a gente não julga o passado com os valores do presente. Mas meu pai deixou de trabalhar com madeira nativa, passou a trabalhar com reflorestamento. Porque ele era madeireiro, mas ele não cometia crime. Ele fazia o que era legal, onde era legal. 

[MÚSICA]

SÔNIA: Aí eu fui trabalhar em Londres. Foram meses bem agitados. Teve atentado terrorista em Paris. Fui lá cobrir. Teve várias coisas acontecendo. Entrevista da princesa Diana para a BBC, falando um monte de coisas. E eu procurando casa para morar, procurando escola para a Mariana. A Mariana tinha ficado no Brasil e ia chegar assim que eu tivesse me instalado. E aí, um belo dia, eu chego no escritório, telefone para você, o Evandro Carlos Andrade. Eu queria dizer para você que abriu uma vaga em Nova York. Nova York nunca teve uma correspondente mulher e eu quero que você vá para Nova York. Eu falei: eu tenho escolha? Ele falou: tem, mas eu vou ficar mais feliz se você for. Eu falei, vou fazer o quê? Eu fui chorando. Eu não queria sair de Londres. Eu achava que ali tinha um monte de assuntos que me interessavam. E você cobrir toda a Europa, África, Oriente Médio. Não tinha ninguém no Oriente Médio na época. Mas aí eu fui para Nova York. Dessa vez, eu já fui com a filha a tiracolo. Mas desembarquei lá com pilhas de neve pelas ruas. E a Mariana a tiracolo. E lá fiquei quatro anos.

RODRIGO: E na primeira semana, você já trabalhou com um cinegrafista que depois virou uma pessoa um pouquinho importante…

SIMONE: Teve uma mudança pessoal importante também, né?

RODRIGO: Como é que foi essa pauta em que vocês se conheceram?

SÔNIA: Adoro contar essa história. Essa história é aquela história assim… Estou procurando casa para morar, aquela coisa. O Pontual era o chefe do escritório e me ligou e disse assim: Sônia, não é a matéria que eu queria para a sua estreia. Eu sei que você ainda não está instalada. Você não devia estar trabalhando. Mas daí surgiu uma pauta tão interessante. Descobriram uma escultura atribuída ao Michelangelo na Casa da Cultura da França, que fica na frente do Metropolitan. Eu mandei para lá o cinegrafista Paulo Zero e eu queria que você fosse encontrar com ele para fazer essa matéria. 

RODRIGO: Você sabia quem era o Paulo?

SÔNIA: Eu via crédito do Paulo a vida inteira. 

RODRIGO: Só nos créditos. Mas nunca tinha encontrado.

SÔNIA: Eu já tinha encontrado no dia que eu fui lá no escritório. Cheguei e fui ao escritório. Me apresentaram para a turma toda. E aí eu chego lá para fazer a matéria. O Paulo estava lá. Eu fiz a minha primeira matéria em Nova York, minha primeira matéria com o Paulo. E a escultura atribuída ao Michelangelo era de um cupido. Vamos lá! Tem história mais fofa que essa? Ainda bem que deu certo, já são 30 anos no ano que vem.

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: Multidões de turistas visitam o museu Metropolitan para ver os maiores tesouros da história da arte. Mas faltava uma parte importante do Renascimento. O que ninguém imaginava é que do outro lado da Quinta Avenida, numa mansão que hoje pertence ao governo francês, num salão escuro, este cupido era a única escultura de Michelangelo nas Américas.

[MÚSICA]

SIMONE: A Sônia personifica a versatilidade de uma boa repórter, e revela um gostinho especial por temas de ciência.

SÔNIA: Eu sempre tentava fazer mais matérias de ciência. E, quando fui ser correspondente em Nova York, tinha um universo aberto para mim. Era um momento em que estava sendo mapeado o genoma humano. Que a gente estava compreendendo o genoma do câncer e outras coisas. A gente estava fazendo muitos avanços em drogas e como se faziam essas drogas, remédios, né? Quando eu era correspondente em Nova York, os primeiros planetas fora do sistema solar foram descobertos e mapeados. Então, eu adorava ir para a NASA fazer matéria. Ali, com toda a ciência produzida nos Estados Unidos, para quem está afim de fazer matéria de ciência, aquilo ali é um tesouro, né. E quando eu voltei para o Brasil, muita coisa estava acontecendo aqui também. Muita matéria, eu estava em São Paulo, muita descoberta, mapeamento do genoma do câncer, estava sendo feito no Instituto Ludwig. Então, estava um momento de muita produção científica também no Brasil, continuei fazendo e, enfim, sempre que eu tenho oportunidade, eu faço.

[MÚSICA]

RODRIGO: A gente separou aqui três entrevistas que você fez, que eu acho que são simbólicas, né? E queria que você comentasse um pouquinho sobre cada uma. A do Fujimori, a do Collor, e a do Dalai Lama. Mas começando pelo Fujimori, porque você… A pauta não foi exatamente essa no começo, né? Vocês foram lá cobrir, enfim, a questão da embaixada e tal, e você conseguiu o contato pra fazer essa entrevista. E aí vocês passaram acho que um dia com ele, né? Como é que foi aquilo ali?

SÔNIA: Foi assim, a gente tava em Nova York, tinha o sequestro na embaixada japonesa. E aí de repente sai a notícia de que eles tinham feito um túnel, entraram, mataram todos os sequestradores e alguns reféns também. Era mais rápido a gente chegar saindo de Nova York do que saindo de alguém no Brasil. E aí Paulo e eu embarcamos pra Lima.

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

William Bonner: A tomada da embaixada japonesa em Lima foi uma operação milimetricamente planejada, como mostra a enviada da Rede Globo à capital peruana, Sônia Bridi.

Sônia Bridi: Blindados, soldados, a Swat peruana. A casa do embaixador japonês ficou cercada hoje. No jardim e dentro da mansão, o esquadrão antibombas procura granadas e minas montadas pelos guerrilheiros.

SÔNIA: Eu sei que teve uma coletiva do Fujimori, eu consegui fazer a pergunta. 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: O presidente Fujimori hoje usou uma maquete da casa para explicar os detalhes da operação. Perguntei quanto tempo ele levou para tomar a decisão. O presidente disse que tudo estava pronto desde segunda-feira. E que ontem, quando recebeu o telefonema dizendo que o momento era o ideal, não pensou nem um segundo para ordenar a invasão.

SÔNIA: Quando terminou a coletiva, eu cheguei perto e falei assim… Presidente, eu sou da televisão brasileira, eu queria uma entrevista. Ele disse: Ah, atende a senhorita aí. O cara disse ok, trocamos o número de telefone, e o cara disse… Me liga. Fiquei ligando. Nisso, fui ao cemitério de Lima para fazer o lugar onde enterraram, de noite, os corpos dos sequestradores. Encontrei lá uma mãe, que foi uma história de partir o coração. Ela disse que a filha foi sequestrada em uma vila lá nas montanhas. Passou um pessoal do grupo guerrilheiro e carregou um monte de jovens, adolescentes. 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: Dona Elijah procurou pela filha durante anos. Andei por fazendas, pelas montanhas, por lugares que nem conhecia. Quando sabia de um confronto, ia atrás e perguntava: vocês viram uma branquinha, baixinha, gordinha?

SÔNIA: E aí quando teve o sequestro na embaixada, ela está assistindo televisão, e uma sequestradora abre um pedacinho, assim, de uma cortina, e ela reconhece a filha. Aí ela foi, ela ficou no plantão durante semanas, na frente da casa. Ela ouviu os tiros. E ela queria ver o corpo da filha.

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: O governo decidiu enterrar os guerrilheiros como indigentes, sem direito a velório nem à presença da família. Eles foram sepultados neste cemitério miserável da periferia de Lima. A filha de dona Elijah deve estar em uma dessas sepulturas. Queria fazer um enterro, abençoar, levar flores, nem sei onde ela está.

SÔNIA: Essa mulher foi vítima de tantas formas que não dá nem para… enfim, tinha voltado para Nova York, quando finalmente saiu a entrevista. Ela disse assim… Ah, vão, se hospedem em tal hotel, que a gente diz a hora que o presidente estiver liberado, vocês vão lá para fazer a entrevista. Onze horas da noite a gente recebe a ligação para ir para o Palácio. Chegamos no Palácio, fazem aquela entrevista sentada e tal. Fujimori é um populista, não é? E ele respondia. De repente, ele dizia assim… Está vendo a minha meia furada? É porque estou solteiro, não tem ninguém para cuidar de mim. E aí eu falei assim… Presidente, eu queria fazer mais um perfil seu. Será que eu podia acompanhar um dia de trabalho seu? Ele: Fulano, como é que está nosso dia de amanhã? Amanhã tem as festas de Dia das Mães. Ah, a senhorita aí está convidada. E a gente saiu no carro, o motorista, o Fujimori, eu e o Paulo, andando pelas ruas de Lima, janela aberta, onde passava, o pessoal gritava… Chino! Chino! 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: Quatro juízes do tribunal constitucional que votaram contra uma segunda reeleição agora são investigados por uma CPI, acusados de abuso de poder. Como se nem estivesse envolvido na polêmica, Fujimori hoje só pensa em festa. Saúda as mulheres do clube de mães. “Queridas meninas”. Mas não faz discurso. Faz sorteio. São quase mil eletrodomésticos, entregues por Fujimori, e pagos com dinheiro público.

SÔNIA: E ele ainda ficava, o Paulo lá filmando, e de repente ele dizia assim, no meio daquela coisa, ele era um animador de auditório. E ele dizia assim: E aqui está mi novia brasileña. E eu só via o Paulo kkkk, morrendo de rir do mico que eu estava pagando ali. Mas isso tudo fez parte da composição do personagem, né?

[MÚSICA]

SIMONE: E sobre o Fernando Collor, a entrevista que você fez com ele.

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: O senhor está sendo julgado pela Receita Federal por sonegação fiscal.

Fernando Collor: Não, eu não estou sendo julgado pela Receita Federal. Isso é outra mentira, não estou sendo julgado coisa nenhuma! Não existe processo legal formado! Isso é uma mentira, uma pantomima, uma patuscada. Eu repudio e repilo isso, com toda a veemência da minha força interior e do meu coração.

SÔNIA: Você sabe que é uma coisa que eu tenho muito até hoje. Eu não sou uma pessoa super calma, de jeito nenhum. Mas, nos momentos de tensão, eu sou extremamente focada. 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Fernando Collor: Quer dizer, por que perguntar a mim se eu conheço esses camaradas. Por quê? Por que eu teria que conhecê-los? Por que eu teria que ter vinculação com qualquer tipo de máfia? (Bate na mesa) Eu sou um presidente da República!

SÔNIA: Eu cheguei, ele já estava muito tenso. Ele me deu um aperto de mão, quase me quebrou a mão. Conforme eu fui perguntando, ele ia ficando pior, pior e pior. 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Fernando Collor: Nota oficial? Você me faz perguntas inteiramente desinformada, minha filha. Filhotinha, você está desinformada. Eu nunca disse que sou candidato em 98. O que eu disse é que serei novamente candidato, quando a oportunidade aparecer!

SÔNIA BRIDI: E ali, ele tinha dado várias entrevistas, que ele provocava o repórter a brigar com ele, para ele ter uma desculpa para parar de responder as perguntas. 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Fernando Collor: Você não está aqui de boa fé, minha filha. Você não está de boa fé, as suas perguntas não são de boa fé. As suas perguntas estão viciadas, estão eivadas de má fé!

SÔNIA: Quando eu estava gerando, o assessor dele chegou lá e me pediu para não botar no ar, para não mandar. Eu falei: você está maluco que eu não vou mandar. Então, já estou gerando para o Rio. Agora, eu imaginei que o Rio ia pegar dois pedacinhos. Eles botaram basicamente a entrevista inteira no ar. Você tinha um perfil da pessoa ali, muito, muito, muito forte. É um rascunho sem aparos, né?

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Fernando Collor: Me desculpe a veemência e a indignação que toma conta de mim. Por isso que eu estou falando assim, eu não posso aceitar isso. Chega, chega, basta!

RODRIGO: Eu tô muito curioso pra saber como foi o encontro com o Dalai Lama, a hora que você encontra com ele assim.

SÔNIA: Eu saí de Pequim para entrevistar o Dalai Lama e eu ia voltar para Pequim com a entrevista do Dalai Lama. O inimigo público número 1 do Partido Comunista Chinês. Chegamos lá em Dharamsala, que é a cidade onde ele vive no exílio. Para entrevistar o Dalai Lama, a primeira coisa chocante é que a gente tem que passar por um detector de metal. Tudo é revistado, todo o equipamento, por causa de segurança, porque o cara vive ameaçado. Aí nós chegamos, eles prepararam uma sala para receber a gente. Aí o Dalai Lama chega na sala. Ele chega sorridente, muito gentil, muito curioso. Enquanto o Paulo estava acertando o áudio e tal, ele perguntou, onde você mora? O que você faz? Você tem filhos? E você que está morando em Pequim? Eu estou vendo que está se abrindo. Você acredita que eu vou poder voltar? Que vai ter diálogo? Aquilo me deu uma facada no coração. Eu falei: eu sinto muito te dizer isso, mas não. Eu acho que não. Aí eu fiz toda a entrevista. E o Paulo, ele foi o tempo todo reclamando. Você acha que a gente está vendo essa distância toda para entrevistar um padre? O Paulo é ateu, mas ele é um ateu fervoroso. É um sentido quase religioso do ateísmo dele. Enfim, começa a rolar a entrevista e eu vejo que o Paulo está encantado com as coisas que ele está ouvindo. 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: Mas é possível ter espiritualidade sem religião?

Dalai Lama (com tradução de Cid Moreira): Claro. Não só é possível como é necessário. Há tanta gente que não tem religião mas tem compaixão, afetividade, consciência dos direitos dos outros. 

SÔNIA: E eu fui ficando com a sensação de que ele também é ateu. Eu saí com essa sensação muito forte. Daí eu falei para ele assim, mas se você não tem religião, mas você vive uma vida ok, você respeita os outros, você tenta estar com os olhos abertos, ter compaixão e tal. Ele falou, minha filha, isso seria o mundo ideal. Mas a maioria das pessoas precisa de uma ajudinha para poder ser bom. O Paulo adorou essa resposta. Saiu dizendo, o careca é legal, o careca é legal.

[MÚSICA]

RODRIGO: Simone, vamos pras séries então?

SIMONE: Vamos, vamos.

RODRIGO: Então vamos lá. O que te marcou mais, tanto na Terra que tempo é esse, Planeta Terra, a Jornada da Vida, são séries que você fez ali que ficaram muito marcadas no jornalismo ambiental.

SÔNIA: Terra que Tempo é Esse foi o seguinte. Em 2009, a gente voltou para o Brasil. Estava na França. Depois da China, a gente foi para a França. Quando eu estava negociando a volta, eu falei assim, a Convenção do Clima de Copenhague promete ter um acordo, melhorar as coisas, porque o Bush tinha saído, tinha entrado o Obama e havia muita esperança de que saísse um acordo. Eu fui e foi um desastre. Foi vergonhoso, embaraçoso, os líderes saindo pela porta dos fundos. Naquele momento, foi um protagonismo do Brasil, que o Lula chegou e disse assim: nós estamos dispostos a fazer sacrifícios, mas vocês têm que se mexer. Mas nada aconteceu. Só iria acontecer seis anos depois, em Paris, um acordo e muito abaixo da expectativa, e que não está sendo cumprido. Mas eu me lembro que no voo de volta, eu e Paulo, com escala em Portugal, viemos naquele sentimento de desânimo. Eu falei assim: agora, sem esse acordo, vai ficar uma sensação de que não há uma urgência, de que não tem problema, de que nada está acontecendo, quando a gente sabe o que está acontecendo. A gente discutindo isso. Aí o Paulo falou assim: e se a gente fizesse uma proposta de fazer uma série sobre isso? Ele me incentivou a fazer isso. Eu cheguei em casa, chamei a Mariana, minha filha, em 2009, o Pedro tinha 7, 8 anos de idade. Chamei a Mariana e disse: você sabe fazer PowerPoint? Me ajuda aqui, estou aqui com umas fotos, quero apresentar um negócio para o Luizinho. Luizinho vem a ser o Luiz Nascimento, que durante mais de 30 anos foi o diretor do Fantástico e talvez o jornalista mais atrevido que eu já conheci na vida. Atrevido de fazer coisas…

SIMONE: Ousadas.

SÔNIA: Ousadas. Ele bancar projetos e ideias muito ousadas, muito diferentes, inovadoras e tal. 

RODRIGO: E aí você levou o Powerpoint para ele?

SÔNIA: Levei o PowerPoint e mostrei para ele. Mostrar lugares lindos, não sei o quê, mas tinha 30 países. Aí ele falou… Vamos dar um jeito, vamos fazer. Te dou tanto para fazer. Com tanto, o que dá para fazer? 30, 29, 28, 27, 26… Cara, a gente ainda segurou 14 lugares que tinham uma representação. Um em cada continente, um era seca, outro era enchente, outro era elevação do nível do mar. E nessa, a gente foi para a Groenlândia, a gente subiu Kilimanjaro, a gente foi para a Austrália mostrar seca, foi para a Veneza falar da subida do nível do mar e o Projeto Mose. Fomos para Vanuatu, lá no Pacífico, fazer as ilhas em perigo, mesmo as ilhas que são altas, né?

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: A meio mundo de distância de Veneza, outros lugares ameaçados pelas águas não têm como se defender. Países formados de pequenas ilhas, como Kiribati e Tuvalu, vão desaparecer se o nível dos oceanos subir pouco mais de um metro. E mesmo os que têm ilhas mais altas, como este aqui, Vanuatu, que não vai desaparecer totalmente, corre um risco não menos assustador: ser jogado ainda mais profundamente na pobreza por causa das mudanças climáticas.

SÔNIA: A gente conseguiu dar um panorama do que estava acontecendo no clima do planeta. E até hoje acho que foi a primeira série de TV aberta falando muito com detalhes sobre a previsão, sobre os relatórios científicos, o que estava acontecendo e mostrar já acontecendo em alguns lugares. 

RODRIGO: Você citou o Kilimanjaro, Sônia, como é que se sobe o Kilimanjaro? Como é a preparação física e mental?

SÔNIA: Pois é, quando eles aprovaram com o Kilimanjaro e tudo, eu falei, agora, né? O Paulo falou assim: Pediu? Queria? Agora vai.

SIMONE: Agora tem que ir.

SÔNIA: E aí eu comecei a treinar com muita disciplina. Chamamos um personal e aí todo dia eu e Paulo treinamos, treinamos, treinamos, começamos em janeiro e subimos em setembro. 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: E agora a gente tá partindo. A viagem até o cume vai levar no mínimo 6 horas, e são 1.100 metros de altitude a 45 graus, é uma subida bem pesada. Vai ser difícil, mas a gente vai começar a jornada. Vamos lá.

SIMONE: E qual é o tamanho da equipe? Foi só você e o Paulo? 

SÔNIA: Essa série foi só eu e o Paulo.

SIMONE: E para ele é mais difícil ainda, né? Porque ele tem que carregar os equipamentos.

SÔNIA: Mais difícil. E o equipamento era mais pesado, né? Então, no Kilimanjaro a gente contratou dois carregadores que ficaram só com a gente. Então, éramos nós dois e tinha mais dois. E tinha um grupo de outras pessoas brasileiras subindo também, né? 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

SÔNIA: A primeira luz da manhã já nos encontra na borda da cratera. Na nossa frente, uma geleira. Paramos, e o sol desponta. Depois de nove horas de caminhada, chego ao pico Uhuru, a 5.895 metros de altitude. É o topo da África. O cansaço e o prazer da conquista me surpreendem. Difícil falar aqui porque tem a emoção, mas também tem a falta de ar. O ar aqui em cima é muito rarefeito.

RODRIGO: Ainda tinha a história de quando vocês chegaram no cume, você queria descer, não se atrasar o voo de volta, porque era aniversário do Pedro, não tinha essa história?

SÔNIA: Exato. Chegamos de volta no dia do aniversário do Pedro. No dia do aniversário do Pedro. E o Pedro também é um garoto que adorava assistir documentários, ciência, não sei o que. No dia que a gente estava saindo pra subir o Kilimanjaro, ele olhou pra mim, imagina, tinha 8 anos, né? Falou, mamãe, é o seguinte, se você sentir dor de cabeça, você desce da montanha. Se você sentir enjoo, você desce da montanha. Se você estiver com dificuldade pra respirar, desce da montanha. Porque esse negócio mata, hein? Eu falei, pode deixar que eu vou estar bem responsável. Virando pro Quênia, porque ali fica em cima da fronteira do Quênia com a Tanzânia, né? Pegamos… Eu liguei pra ele. Estamos aqui. E ele ficou super feliz. Comemorou.

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: Já embaixo, a 3 mil metros, nossa equipe de apoio se despede com uma melodia. Que ecoa em nossa memória durante dias, e ainda vai ecoar quando todas as neves do Kilimanjaro já tiverem sumido. [Segue o canto]

SÔNIA: Aí isso foi em 2010. Aí em 2012 tinha Rio + 20. E nesse momento tinha um projeto na Globo chamado Globo Natureza, que era tocado pelo Humberto Pereira, que era diretor do Globo Rural. E aí o Humberto me chamou em São Paulo e eu cheguei lá e ele disse assim: Sônia, a gente quer fazer uma série, pro Fantástico, comemorativa ao Rio + 20, mas a gente quer falar de recursos naturais e população e tal. Eu falei assim: vocês têm já um desenho da série? Ele falou, não, mas eu tenho uma chamada ótima. A repórter Sônia Bridi percorre os países mais populosos para saber: Vai ter energia para todo mundo? Vai ter água para todo mundo? Eu falei, pô, está avançado o negócio.

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Zeca Camargo: Chegou a hora da nossa estreia de hoje. Planeta Terra: lotação esgotada. Uma grande investigação comandada pela nossa colega Sônia Bridi, bem-vinda, claro, aqui sempre.

Sônia Bridi: Obrigada, Zeca.

Zeca Camargo: Conta pra gente como foi essa aventura.

Sônia Bridi: E bota aventura nisso.

Zeca Camargo: Do jeito que eu gosto.

Sônia Bridi: O repórter cinematográfico Paulo Zero e eu fomos aos cinco países mais populosos do mundo e também à África, o continente que mais cresce, para descobrir: afinal, quantas pessoas o planeta pode sustentar?

SIMONE: A outra série era A Jornada da Vida, de 2014.

RODRIGO: Foi em 2014.

SÔNIA: 2014 a gente começou. Em 2013 foi aniversário do Fantástico. Eram 40 anos do Fantástico. O Luizinho pediu sugestão de séries. E eu sugeri uma série para falar sobre a origem da vida. Tinha naquele momento gente discutindo ensinar criacionismo nas escolas. E eu achei que era um ato de rebeldia, resistência, a gente falar de evolução. 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: Em 1835 um jovem pesquisador inglês passou por essas ilhas. Ele só ficou cinco semanas. Mas as observações que ele fez mudaram pra sempre a nossa compreensão da vida no planeta. Charles Darwin desvendou aqui os caminhos usados na Jornada da Vida.

SÔNIA: E aí fizemos uma segunda temporada com a mesma pegada. Na terceira temporada, o Humberto me disse: Sônia, eu gostaria muito de fazer uma coisa sobre os rios. Eu falei: então por que a gente não faz os rios que foram berço de civilizações? 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: Nossa nova jornada percorre o Rio Nilo. Das selvas da África ao deserto. Das montanhas ao mar. O Nilo das reservas de vida selvagem. Das pirâmides desconhecidas. E dos faraós negros. O Nilo generoso que dá o pão. O Nilo Deus, que deu origem a uma das civilizações mais fascinantes da história da humanidade.

[MÚSICA]

SÔNIA: É muito evidente a importância da Amazônia. 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: Estamos na Amazônia, no Rio Negro, perto de Manaus. A estação de chuvas já começou.

SÔNIA: Porque é esse estoque imenso de carbono que se torna crucial para poder segurar o clima do planeta. Se a gente fizer tudo certo e conseguir salvar a Amazônia, a gente tem chance. Se a gente fizer tudo certo, mas a gente falhar com a Amazônia, a gente não tem redenção. Eu tenho ido muito à Amazônia, para falar de desmatamento, de mineração ilegal, de garimpo ilegal, fui no Tapajós, fui no Caiapó, fui por toda a parte da Amazônia, fiz matéria com os Guajajara, os Guardiões da Floresta. E os Yanomami, eu estava muito em contato com eles já há muitos anos, tinha recebido um convite para fazer para subir o Pico da Neblina com eles, porque eles estavam fazendo um projeto para combater o garimpo. Ainda era pouco o garimpo, tá, isso foi pré-pandemia. Mas assim, a partir de 2016 começou a crescer muito. Você vê a linha de garimpo na terra Yanomami, você vê ela vem assim, encostando no chão, tem um pouquinho, sempre teve, só que aí em 2016 ela sobe, e em 2019 ela dispara.

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Repórter: De 2019 pra cá, os garimpos são a principal causa do crescimento expressivo do desmatamento na terra yanomami. O aumento chegou a 140%.

SÔNIA: E volta e meia eu falava com o Bruno Pereira sobre isso, eu conheci ele só por telefone. E a gente estava combinando uma viagem para o Vale do Javari, que ele queria mostrar como é lindo o Vale do Javari. A ideia dele era mostrar assim, aquela biodiversidade humana que tem lá, que é incrível. Então eu estava ali com os yanomami, contato com o Bruno, ali na floresta a gente anda acompanhando cientistas lá. E aí começam a surgir informações de que dentro da terra Yanomami, na parte de Roraima, estava tendo um avanço do garimpo muito grande, a gente olhava no satélite, pegava lá com o pessoal do Map Biomas, e enxergava ali no satélite, e não conseguia entrar na terra. E aí eu passei quatro anos reportando pelas bordas da terra Yanomami. Então, no dia que o governo tomou a decisão, era uma sexta-feira, eu estava fazendo o documentário do assassinato do Bruno e o Dom, estava saindo para ir visitar minha mãe, era uma sexta-feira, eu estava dentro do carro já para dirigir para o aeroporto, toca o telefone, o Bruno me chama, o Bruno é o diretor do Fantástico. Sônia, onde você está? Eu falei: estou dentro do carro para ir para o aeroporto. Ele falou assim: cara, sobe aqui, fala rapidinho. Eu disse: eu vou perder o voo. Ele disse: você vai querer perder o voo. Aí eu cheguei lá, disse: olha, o Lula vai decretar a emergência, e se você for para Boa Vista, eles vão facilitar a sua entrada, você vai poder entrar, eles vão autorizar a sua entrada. Isso foi num sábado, no domingo eu entrei, e eu fiquei 24 horas lá dentro e eu vi as coisas mais horríveis que se pode ver.

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: Aqui na comunidade do Tirei, dá pra ver direito como é que a fome se instalou entre os yanomamis. O garimpo tá praticamente dentro da aldeia. Toda essa água foi contaminada, não dá mais pra beber. E o rio tá morto, não tem peixe pra comer.

SÔNIA: Assim, de chegar nas aldeias, o garimpo dentro da aldeia tinha garimpado a roça deles, eles chegam com arma de fogo, os Yanomami ainda caçam muito com arco e flecha, chegam, eles acabam com toda a caça, destroem as roças, ficam dando bolacha, biscoito para os indígenas comerem, levam cachaça. Como forma de dominação, destruição da estrutura, estrutura da aldeia, dão armas, alimentam conflito. E a fome, a fome. Aquelas crianças, velhos, adultos, todo mundo pele e osso. Um horror aquilo que a gente viu ali. 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: É difícil entender como um lugar tão rico virou palco da maior crise humanitária no Brasil neste século.

SÔNIA: E aí foi decretada emergência. E eu continuei indo. O governo federal tinha entrado junto com as forças armadas, primeiro estabeleceu ali uma base num determinado ponto que servia para reabastecer os helicópteros do Ibama e da Polícia Federal, que tem menor alcance e tal. De repente desmobilizou tudo. Então, quando nós chegamos com um ano de operação, tinha desmobilizado muito e a situação estava muito ruim ainda. Bem ruim. E aí o governo mudou de estratégia. Eu já estava em Roraima, sabendo que eu ia conseguir entrar porque as ministras, a Sônia Guajajara e a Marina Silva, iam entrar para ver como estava depois de um ano. E elas estavam defendendo uma mudança de estratégia para passar para os civis a coordenação de tudo. E eu já estava lá. Aí em janeiro eu não pude ir, quando fez dois anos. Mas surgiu a oportunidade com o aniversário da Globo. Eu sabia que tinha melhorado, mas eu não esperava encontrar uma melhora tão significativa. 

[ÁUDIO DE REPORTAGEM]

Sônia Bridi: Ei, olha aqui como elas estão gordinhas! Meu Deus do céu. Foi ela que eu carreguei, foi! Olha só como você tá forte! Vem cá! Vem aqui. Ai que linda, como você tá grande! Meu Deus do céu! Deixa eu ver se você tá pesada, vem. Deixa eu ver se você tá pesada. Opa, agora tá difícil de pegar no colo. Olha só o tamanhão que ela tá! Gente, que alegria, né, de ver essas crianças bem. Olha, tá gordinha, tá pesada, não vou poder ficar segurando muito tempo.

SÔNIA: De aldeia em aldeia, onde eu fui parando, eu fui vendo melhoras muito significativas. Que mostram que o responsável pela fome, pela miséria, pelas mortes, por tudo era o garimpo. É o garimpo. É o crime. E eles já estão caminhando para uma autonomia. As roças estão crescendo, eles estão caminhando para uma autonomia. 

[MÚSICA]

RODRIGO: Você falou agora sobre cenas que são difíceis de ver para o jornalista que está ali cobrindo. Você começou falando sobre a chacina da Candelária, que foi muito difícil de ver. Agora você está falando sobre a questão do Yanomami. Eu queria que você comentasse mais uma para gente ir pro encerramento. Eu já vi você falando que foi uma das coberturas mais difíceis, se não a mais difícil da sua carreira. Que é a da tragédia da região serrana. Em 2011. 

SÔNIA: Tem coisas que eu nunca vou esquecer. Aqui em Teresópolis, eu cheguei lá no dia seguinte à tragédia, eu fiquei três dias e três noites andando por lá. Eu e o Paulo ficamos, só nós dois, andando a pé, subindo e descendo aqueles lugares. Eu cheguei num lugar lá já tinha 48 horas da tragédia não tinha aparecido ninguém bombeiro, nada ainda. E não tinha telefone, não tinha sinal de celular lá em cima. Uma senhora que não conseguia se deslocar, só estava preocupada em dizer para a filha dela que ela estava viva. Aí eu desço, quando deu o sinal do celular, eu liguei para a filha. Na hora que ela atendeu o telefone, eu me toquei assim… Cara, como é que eu vou dizer pra ela? Porque a hora que eu falar que é Sônia da TV Globo, ela vai achar que a mãe morreu. Eu só falei: Fulana, sua mãe tá viva. E depois eu me apresentei. Porque eu me botei no lugar, imagina esse telefonema, essa menina recebendo esse telefonema, né? Você não esquece. Você vive com isso. E traz muita responsabilidade, eu acho, né? 

RODRIGO: E quando você fala isso da ligação que você tem que fazer para uma mãe, enfim, isso é uma coisa obviamente muito difícil. E você chegou a ter essa questão contigo, por exemplo, na cobertura que você fez na Antártida em 2013, quando seu pai teve o problema do infarto e você teve aquela questão da comunicação que parou e você não sabia como é que estava e querendo voltar. Então, você sabe também na pele o que é para uma família não ter a notícia ou precisar da notícia e não conseguir. Como é que foi aquele momento ali também? 

SÔNIA: Nossa, foi horrível. Foi horrível. Eu tava super feliz de estar lá. A Antártica é incrível. Então, a gente estava lá fazendo matéria e, de repente, eu recebo um e-mail de uma das minhas irmãs, a minha irmã caçula, que é médica, dizendo: Ai, Sônia, não se preocupe, o pai vai ficar bem. Como assim? Bem do quê? E aí eu consigo uma informação de que ele tinha tido um infarto muito grave. E aí começa um furacão na Antártica. E a gente ficou três dias sem comunicação, rodando na Baía do Almirantado. Foi horrível, horrível. Eu passava metade do tempo passando mal e a outra metade do tempo chorando de frustração e coisa. Eu consegui voltar a tempo de ver meu pai ainda com vida, mas ele morreu na noite que eu cheguei e eu estava com ele. Essa é a ironia, né? Quando eu decidi não ficar mais no exterior, uma das coisas que pesou muito foi que eu queria estar mais perto deles. E aí, nesse momento eu que tava longe.

[MÚSICA: Bom, a gente passou por mais de três décadas de coberturas marcantes da Sônia… e chegou a hora de saber o que ela acha da cobertura ambiental que é feita hoje pelo jornalismo. 2025 é um ano muito importante, ano de COP 30 em Belém, que a Sônia certamente vai acompanhar de perto. Então a gente quis saber a visão dela sobre a maneira como o jornalismo encara o tema da emergência climática hoje.

SÔNIA: Primeiro, encara muito melhor do que dez anos atrás. Isso, absolutamente. Eu acho que houve uma mudança geracional nas redações. O pessoal da minha geração, muita gente entrava numa de não acreditar em mudanças climáticas. Foi um processo. O jornalismo não é diferente do resto da sociedade. Eu estou sempre alertando os nossos colegas, alertando, não sei quem sou eu para ficar mais… Enfim, sugerindo ou lembrando, às vezes, principalmente os editores-chefes, o pessoal que os editores têm a questão de explorar petróleo na foz da Amazônia, tem uma questão econômica? Tem. Mas qual a consequência disso? Qual é a consequência ambiental? Tudo está sendo impactado e vai ser impactado ainda mais pelas mudanças climáticas. Mas a verdade é que não é o urso polar, é que quando ele for embora, a gente vai estar bem ferrado.

SIMONE: A Sônia falou também sobre a relação com os cientistas.

SÔNIA BRIDI: Eu acho que tem se tornado mais fácil porque a consciência dos cientistas da importância de prestar contas do trabalho deles isso tá aumentando. A ciência é na sua grande maioria paga com dinheiro público. As pessoas têm o direito de saber o que tá sendo feito com esse dinheiro. Eu sempre deixo meu telefone com todo mundo, e eu sempre digo: se você tiver alguma coisa que você acha que é importante… ciência básica às vezes é super importante mas é muito cascudão para televisão. Mas mesmo ciência básica. Deixa que eu avalio. Deixa que eu vejo se a gente acha um jeito de botar isso numa matéria. E se eu não conseguir fazer a matéria e eu entender que é importante, eu encaminho pros meus colegas. Eu acho que eu tô colhendo muito resultado disso, porque eu recebo muita, muita mensagem, email, conversa, com sugestão de pauta. E eu não dou conta de fazer tudo, porque felizmente a gente tem bastante gente produzindo ciência de muito boa qualidade no Brasil.

[MÚSICA]

SÔNIA: E eu acho que o jornalismo local, se você me perguntar qual é o jornalista mais importante, é o cara que faz notícia local. Porque é a notícia local que o cara está ali e ele pode conferir se é aquilo mesmo. Então, a credibilidade do jornalismo está muito na mão do jornalismo local. Ao mesmo tempo, tem coisas que têm que ter essa coisa que eu chamo de comando e controle, que eu tenho feito muito na Amazônia. Eu não estou morando na Amazônia. Se os caras quiserem se vingar de mim, eles vão ter que vir para o Rio de Janeiro. Já dá um trabalho, porque eles não estão no ambiente deles. Mas, se o repórter local for fazer exatamente a mesma coisa que eu estou fazendo, ele pode sofrer retaliação. Então, é preciso que o jornalismo nacional vá lá e dê conta de algumas coisas também até para poder reforçar o jornalismo local. Reforçar o jornalismo local é a melhor maneira de reforçar a credibilidade do jornalismo. 

[MÚSICA]

SÔNIA: Eu acredito num jornalismo, primeiro, que é o jornalismo baseado em fatos, que é o único jornalismo que pode existir, o resto não é jornalismo, é outra coisa. Eu acredito num jornalismo que olha para todos os aspectos do que está sendo feito ou reportado. E que não ignora, talvez, a maior cobertura de todos os tempos da história da humanidade, que são as mudanças climáticas. Acredito num jornalismo que é capaz de ser empático, de olhar para as pessoas. E eu tenho visto que essas gerações mais novas, elas estão muito ligadas nisso. Elas já estão com outra… é outra formação. Elas estão vendo coisas acontecerem, então, elas estão muito mais ligados. Acredito que o jornalismo é sempre a mesma coisa. É você sair lá fora e contar uma boa história olhando para as pessoas. 

RODRIGO: Sônia, obrigado.

SÔNIA: Eu que agradeço.

SIMONE: Foi ótimo.

SÔNIA: Foi quase uma sessão de terapia.

RODRIGO: E obrigado não só pelo papo, mas pelo jornalismo que você faz também, que pra gente é muito importante.

SIMONE: Sim! Muito, é um exemplo mesmo.

SÔNIA: Eu sempre penso, eu sempre pensava assim: ah, quando eu tiver 40, não vou mais fazer reportagem. Aí eu cheguei com 40 animadinha ainda. Pensei: 50? Bom, agora acho que não vai muito longe. Aí eu fiz 60. E ainda tô… eu preciso de força física pra fazer as coisas que eu faço, né? Trabalho bastante pra manter a força física. Bom, vou precisar de força… 

SIMONE: Mental também… 

SÔNIA: Preciso estar com a cabeça boa também, né.

RODRIGO: Sônia, mil vezes obrigado.

SÔNIA: Obrigada a vocês.

SIMONE: A gente tem que tirar uma foto.

RODRIGO: Fazer a nossa foto, claro.

SÔNIA: Bora. Coitados de vocês pra editar isso aí agora.

RODRIGO: Vai ser um prazer.

SÔNIA: O pessoal fala mais que o homem da cobra.

[MÚSICA]

RODRIGO: Muito obrigado a você que escutou até aqui. Obrigado à Simone Pallone pela parceria, eu adorei que deu tudo certo pra gente fazer esse episódio juntos. E vida longa ao Oxigênio, Simone!

SIMONE: Eu também agradeço aos ouvintes e a você, Rodrigo, que providenciou o estúdio, o convite à Sônia, a edição. Foi um presente e tanto pro Oxigênio. Também desejo muito sucesso ao Vida de Jornalista, esse podcast que é essencial para jornalistas. E obrigada ao Danny Dee, do Estúdio Rastro, onde gravamos com direito a café e pão de queijo. 

SIMONE: Eu sou Simone Pallone. Este foi o terceiro episódio da série comemorativa dos 10 anos do Oxigênio, na qual produzimos episódios em parceria com outros podcasts. O primeiro foi o Café com Ciência, da Unesp, o segundo o Vozes Diamantinas, da Universidade Estadual de Seabra, e agora o Vida de Jornalista, um podcast independente. Os próximos serão com o Fronteiras da Ciência, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e com o Ecoa Maloca, que é outro podcast do Labjor. Não deixe de acompanhar a série.
Realizei a entrevista e o roteiro com o Rodrigo Alves. Ele foi o responsável pela edição final do roteiro, pela pesquisa dos áudios de reportagens, e pela edição do  áudio do episódio. A trilha sonora é do Gabriel Falcão.

As artes da capa e dos posts de divulgação são da Lívia Mendes.

E vou aproveitar pra fazer aqui uma propaganda das oficinas do Vida de Jornalista: Se você gosta de podcast e quer aprender a fazer, tem inscrição aberta pra Oficina de Podcasts e Narrativa em Áudio. São cinco encontros online com gente do país inteiro, passando por todas as etapas de produção. Entra lá em oficinadepodcasts.com e aproveita. E mais uma vez quero agradecer o Rodrigo por esta parceria que não podia ter sido melhor.
E lembra de seguir a gente nas redes sociais, é só procurar por Oxigênio Podcast! Até o próximo episódio!

[FIM DO EPISÓDIO]

 

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